*Artigo publicado originalmente pelo jornal Gazeta do Povo na internet, na seção Opinião, no dia 14 de julho de 2015.

“A luz do sol é o melhor dos desinfetantes” (Louis D. Brandeis)

O tucano Beto Richa será lembrado como o primeiro governador do Paraná a mandar publicar a lista dos salários de servidores públicos, com os respectivos nomes. Um feito notável, um grande passo em direção à transparência, uma ferramenta fundamental para que a sociedade possa fiscalizar o possível enriquecimento ilícito dos servidores públicos.

Só que Richa também passará à história como o governador que tisnou a transparência dos dados públicos com tons de coação e revanchismo. Pois foram, em fins de maio, justamente (e, até agora, apenas) os professores da rede estadual de ensino, então em greve, que tiveram os salários nominalmente expostos no Portal da Transparência. Com um link direto, destaque que nenhuma outra categoria de servidores recebeu, antes ou depois.

Nas semanas seguintes, foi além: a partir dos mesmos dados, a agência oficial de notícias publicou texto afirmando que professores ganhavam mais que o prefeito em 111 cidades do estado. Curiosos, fomos atrás dos dados, fizemos os cálculos e constatamos: nas sete cidades destacadas no palavrório oficial, aquilo era verdade para apenas um a cada 100 professores. De outra forma: 99% recebiam menos que o prefeito.

Por fim, no último dia 2 de julho, por determinação do juiz Guilherme de Paula Rezende, da 4.ª Vara da Fazenda Pública do Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba, o governo retirou essas matérias do site da Agência Estadual de Notícias.

A figura do “marajá”, o servidor público pago regiamente, mas que pouco devolve à sociedade em qualidade de serviços, talvez seja o legado mais perene do ex-presidente Fernando Collor de Mello à política brasileira. É assim, por exemplo, que ex-governadores do Paraná são imaginados quando se lembram as aposentadorias que recebem. E foi assim, infelizmente, que o professorado foi exposto no Portal da Transparência e na Agência Estadual de Notícias.

O governo feriu, pois, o princípio básico da Lei de Acesso à Informação – a transparência nos dados. Em vez disso, exibiu apenas o que lhe convinha.

Por exemplo: alguns professores têm mais uma rubrica nos salários. Pode se tratar de um cargo em comissão, uma função gratificada, de pagamento de aposentadoria a quem já tenha esse direito. Em alguns casos, fica a impressão de que os docentes recebem dessa forma por trabalharem em duas escolas (às vezes, em cidades diferentes). O fato é que os dados do Portal da Transparência não permitem entender o porquê disso.

Também não é possível dizer se, por exemplo, os salários que o governo indica incluem benefícios como aposentadorias ou licenças – a RPCTV mostrou que há ao menos um caso em que isso aconteceu. Repetimos: limitar o acesso do cidadão apenas aos dados que interessam ao ente público é uma afronta à Lei de Acesso à Informação.

Richa e sua equipe fizeram do Portal da Transparência uma ferramenta de propaganda oficial, um canal de comunicação que pode ter sua função pública submetida às demandas políticas de ocasião – como sempre aconteceu, por exemplo, na Rádio e Televisão Educativa. Vamos lembrar: o Portal da Transparência não é um favor que o governo faz à sociedade, mas sim uma obrigação imposta a todos os entes públicos pela Lei de Acesso à Informação, planejado e criado como um instrumento de controle social.

A boa notícia, para o governador, é que aqui há tempo suficiente de admitir e corrigir o erro. Um bom primeiro passo, por exemplo, seria dar visibilidade aos salários de todos os servidores, incluídos aqui os auditores da Receita Estadual, do alto escalão das polícias Militar e Civil, dos ganhos acumulados pelos servidores que participam de conselhos das empresas públicas. A Justiça também errou, e poderia se redimir de mandar tirar os dados. Devia ter ordenado a publicidade de todas as outras remunerações, isso sim.

Cabe recordar: em 30 de julho de 2013, Richa publicou, em seu perfil no Facebook, que havia determinado a publicação, na internet, do salário de todos os servidores, ativos e inativos, do estado do Paraná. Segundo ele, a medida era “mais uma ação que reforça o valor que nosso governo dá à transparência nas questões públicas”. Ainda estamos à espera de que isso seja feito – mas de forma isonômica e franca, e não de forma a fustigar categorias que se tornem adversários sazonais do Palácio Iguaçu.

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