Mortes por câncer do amianto dobram em 13 anos

A partir do dia 7 de dezembro Curitiba ingressará definitivamente na lista de municípios livres do amianto. Na data, começará a valer na prática a Lei Municipal 14.172/12 que, aprovada há três anos, proíbe a venda e o uso de produtos, artefatos ou materiais que contenham a fibra mineral, também conhecida como asbesto.

No ano que vem, será a vez de São José dos Pinhais, que aprovou em 2013 lei similar para banir o amianto. As cidades abrigam duas grandes empresas que trabalham com amianto, a Isdralit em Curitiba e a Multilit em São José dos Pinhais. Ainda na região está a Eternit, em Colombo, que segue sem previsão de uma legislação específica sobre o uso da fibra. O amianto é proibido em 52 países.

Classificado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como cancerígeno, o amianto é utilizado em mais de três mil produtos industriais – 90% na indústria de fibrocimento para produção de telhas e caixas d’água, e menos de 5% em materiais de fricção. Há anos o Brasil ocupa o terceiro lugar na lista de maiores produtores da fibra, atrás da Rússia, que em 2014, segundo o anuário Mineral Commodity Summaries, produzido pela United States Geological Survey (USGS), produziu mais de 1 milhão de toneladas de asbestos, e da China, com 400 mil toneladas. Em 2014 o país produziu 291 mil toneladas.

A exposição ao mineral pode causar câncer de pulmão, de laringe, do aparelho digestivo e de ovário. Dentre as principais doenças citadas na portaria do ministério da Saúde n.º 1.339/GM, relacionadas por exposição ao amianto em local de trabalho estão a neoplasia maligna do estômago, neoplasia maligna da laringe, neoplasia maligna dos brônquios e do pulmão, mesotelioma de pleura, mesotelioma do peritônio, mesotelioma do pericárdio, placas epicárdicas ou pericárdicas, asbestose, derrame pleural e placas pleurais.

Segundo o Ministério da Saúde, em resposta ao pedido de informação do Livre.jor sobre as restrições legais do uso da fibra em solo nacional, “diversos estudos mostram que período de tempo entre a primeira exposição ao amianto e ao surgimento de doenças é longo, podendo manifestar-se após um período superior a 10 anos após a exposição”. Portanto, mesmo com a proibição, o registro de doenças decorrentes da exposição ao amianto podem ainda crescer nas próximas décadas.

De acordo com os dados do DataSus, câncer como o mesotelioma e pneumoconioses, que segundo o Ministério da Saúde são “patologias que têm cerca de 90% de probabilidade de serem decorrentes à exposição ao amianto”, registraram 1.181 mortes entre 2000 e 2013. Em 2000, foram apontados 63 óbitos em todo o território nacional. O número pulou para 121 em 2013.

No levantamento dos dados, optou-se apenas pelos números de mortes de pneumoconiose devido ao amianto ou outras fibras minerais dentre uma série de pneumoconioses apontadas no banco de dados. Desta forma, o número de mortes decorrentes de exposição ao amianto podem ser ainda maior, uma vez que aqui não foram contabilizados outros tipos de câncer que podem ser causados pela fibra.

Junto à resposta ao pedido de informação do Livre.jor, o Ministério da Saúde encaminhou um estudo elaborado pelo próprio órgão apontando os dados de casos de doenças decorrentes de exposição ao amianto em locais de trabalho. No estudo, que pode ser acessado na íntegra aqui, o Ministério utilizou o banco de dados do Sistema de Informações de Agravos de Notificação (Sinan). Filtrando os dados por diagnóstico específico, o Ministério identificou que, entre 2007 e 2013, foram apontados 2.286 registros de pneumoconiose relacionada ao trabalho, dos quais 1.119 especificamente identificados como decorrentes de exposição ao amianto. O acesso ao sistema do Sinan é restrito. Portanto, não conseguimos os dados que compreendam os dados desde 2000.

Apesar de apresentar um crescente número de óbitos relacionados às doenças que apresentam o amianto como uma das principais causas, não há, no entanto, uma legislação nacional que determine a substituição do amianto no mercado, proibindo assim o seu uso e comercialização. Tal aumento é inclusive apontado pelo Ministério da Saúde, ao afirmar na resposta ao Livre.jor que “a incidência das doenças relacionadas a exposição ao amianto tem se mostrado crescente com perspectivas de aumento”.

O próprio Ministério da Saúde reconhece a existência de outras fibras que possam substituir o amianto e que garantam maior segurança à saúde da população, “a exemplo das fibras de PVA que possuem potencial de risco inferior ao das fibras de asbestos”, e recomenda a “eliminação de qualquer forma de uso do amianto no território nacional, bem como a gestão ambiental de resíduos e o acompanhamento de populações expostas”.

No entanto, o mesmo órgão aponta que, mesmo com a existência de alternativas, conforme aponta o artigo 10.º do decreto 126/91, “deverão ser previstas em legislação nacional a obrigatoriedade de substituição do amianto por outras fibras não danosas à saúde, e até a proibição total ou parcial do uso do amianto ou de certos tipos de amianto ou de certos produtos que contenham amianto para certos tipos de trabalho”.

Desta forma, até que se tenha uma iniciativa legislativa de âmbito nacional, a proibição vai se dando em instâncias estaduais e municipais, como é o caso de Curitiba agora em dezembro e em São José dos Pinhais em 2016, além de diversos outros municípios país afora e estados como São Paulo, Rio Grande do Sul, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Pernambuco, Mato Grosso.

Outras publicações – caso você tenha interesse em se aprofundar sobre os reflexos da exposição ao amianto para a saúde, abordei o tema em dois textos para a imprensa sindical na Revista Diferencial, do Sindicato dos Engenheiros do Paraná.

A primeira reportagem, publicada em junho de 2014 e intitulada Vítimas do amianto: mortos pela ganância, abordamos um pouco da história do senhor Genésio Diniz Medeiros – ou “Seu” Genésio, à época com 69 anos, que após 15 anos de exposição ao amianto em seu local de trabalho, foi diagnosticado com asbestose, uma doença pulmonar causada pela aspiração do pó de amianto, que causa fibrose nos pulmões, devido às cicatrizações das lesões pulmonares promovidas pelo material tóxico. Seu Genésio faleceu em fevereiro de 2015, aos 70 anos. Confira aqui o PDF da revista. http://www.senge-pr.org.br/wp-content/uploads/2014/06/Revista_Diferencial.pdf

Outro texto foi uma entrevista, publicada em março deste ano, com a procuradora do Ministério Público do Trabalho (MPT), Margaret Matos de Carvalho, falando sobre o resultado do julgamento contra a Eternit, que acompanhou na Itália, e dos reflexos para casos similares no Brasil. Confira aqui o PDF da Revista. http://www.senge-pr.org.br/wp-content/uploads/2015/04/RD4_pdf_web.pdf

O tema também foi abordado em entrevista concedida pelo médico Elver Andrade Moronte, do MPT-PR (Ministério Público do Trabalho do Paraná) ao jornalista Rafael Moro Martins, daqui do Livre.jor também. À época, o texto do Moro foi publicado no portal Uol, e pode ser acessado aqu – http://noticias.uol.com.br/meio-ambiente/ultimas-noticias/redacao/2012/11/08/descarte-de-telhas-e-caixas-dagua-esconde-perigo-do-amianto-diz-medico.htm

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