“A falta de uma política de testagem e de transparência dos dados oficiais produziu um quadro artificial que passava a impressão de que a Região Metropolitana de Curitiba (RMC) conseguiu manter a pandemia sob controle”. A afirmação faz parte do relatório final de um estudo realizado por pesquisadores da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e do Instituto Federal do Paraná (IFPR), que analisou o enfrentamento da pandemia de coronavírus na capital e seu entorno no ano de 2020.
Em dezembro de 2020, a Livre.jor publicou parte dos achados iniciais desse estudo, conduzido por membros do Programa de Pós-Graduação em Sociologia e do Grupo de Pesquisa e Extensão em Políticas Sociais e Desenvolvimento Urbano (Pdur) da UFPR. Ali já tinha ficado claro que os gestores da RMC tinham abdicado de combater duramente a pandemia para apenas gerenciá-la, internando os casos graves, numa aposta “na enorme capacidade do SUS de ampliar rapidamente sua capacidade de atendimento“.
“Subestimação do problema”
Conforme registramos, há três meses eles já alertavam para os riscos de persistir negando a existência do inimigo. Agora, com as novas cepas e a escalada dos casos e das mortes por covid-19, a constatação tornou-se dramática: “a baixa testagem, por sua vez, leva a uma subestimação do problema e, consequentemente, só tem utilidade para gestores que não estão interessados em proteger vidas, mas em legitimar uma flexibilização da política de distanciamento social maior do que as necessidades do momento para atender determinados interesses econômicos”.
Diante da falta de dados sobre os testes de covid-19 aplicados nos municípios da Grande Curitiba, os pesquisadores recorreram a uma plataforma menos conhecida do Ministério da Saúde – a IVIS – para entender o que aconteceu. E constataram que a testagem, além de ser baixa, “foi incapaz de produzir informações de qualidade”.
“Nos momentos em que o número de casos foi mais alto, a taxa de positividade aumentou produzindo subnotificação. Quando a transmissão do vírus recuou, a taxa de positividade diminuiu, porém de maneira muito insuficiente para permitir o isolamento e o rastreamento dos pacientes”, constou o grupo da UFPR. Os pesquisadores estimam que “para cada caso notificado na Região Metropolitana de Curitiba, outros 3 permanecem ocultos”.
Muito acima dos 5%
A Organização Mundial da Saúde (OMS) só recomenda a flexibilização das medidas de distanciamento quando o número de testes positivos for de 5% ou menos durante duas semanas. Mas como a política de testagem foi deficitária em toda a RMC, essa situação ideal nunca foi alcançada pelas cidades da Grande Curitiba, como demonstra o gráfico elaborado pelos pesquisadores do Pdur.
A visualização pode ser difícil de entender a princípio, mas para ter noção do tamanho do problema que a baixa testagem é para o enfrentamento real da pandemia por aqui basta entender que a linha vermelha reta, na porção inferior do gráfico, são os 5% de positividade recomendados pela OMS. E as linhas que sobem e descem, bem acima do risco, são as taxas de positividade observadas nos municípios.