Se Ciro Gomes quisesse mesmo vencer as eleições em 2022, seu discurso seria “eu posso vencer o Lula no mano a mano, Bolsonaro não consegue”. É uma tese boa, que tira votos dos outros dois e, se bem executada, poria o pedetista no segundo turno. Mais que boa, ela é pornograficamente óbvia. Por que ignorar o óbvio?
Ciro vê uma oportunidade melhor em 2026, não importa quem ganhe agora. Sabe que se Lula vencer ele não arriscará uma revolução, optando pelo marasmo necessário a todo período de conciliação. Todo político é vaidoso, o ex-presidente não foge à regra. Não vai desperdiçar a chance de polir sua biografia nos livros de história. E o PT que lute pra garimpar um herdeiro dessa fortuna política em 2026.
Se Bolsonaro sobreviver ao 2 de outubro, levar a disputa para o segundo turno e ganhar, carregado pelo antipetismo? Pro Ciro Gomes é ótimo. A esquerda precisará de uma nova liderança e não importa o que ele tenha dito na campanha, o pedetista é o nome da vez. Sem perspectiva de renovação do poder, o clã Bolsonaro perderá apoios chegando em 2026 reduzido a traque. Até a paciência do Centrão tem limites.
Terra arrasada
Nessa toada, tudo leva a crer que, em 2026, Ratinho Júnior estará bem posicionado para ser um nome da centro-direita para a presidência da República. Na disputa à reeleição ao governo do Paraná, não deixou que nenhum candidato à Ciro Gomes se criasse – Cezinha foi almoçado, o Podemos foi jantado (Flávio Arns era um nome de peso, mas faltou tirocínio para Álvaro Dias) e ainda palitou os dentes com o PL e com o União.
Dinheiro pra torrar? Ratinho Júnior tem. Canais abertos com igrejas e agronegócio? De penca. Passado na extrema-direita? O próprio Bolsonaro disse que o governador do Paraná é um dos rostos desse grupo. A posição de Ratinho Júnior no PSD é que atrapalha, pois a legenda tem dono, mas isso se resolve. Que o diga Ricardo Barros articulando em Brasília para compensar a pouca expressão nacional. Noves fora, dá jogo.
Céu de tempestade
Nesse exercício de cálculo político, um cenário com Ciro Gomes contra Ratinho Júnior em 2026 parece bastante palatável. Os dois ocupam um vácuo geracional entre a velhíssima guarda e os líderes do futuro. Ulysses Guimarães já disse que a política se assemelha às nuvens, que você olha agora estão de um jeito, quando olha de novo já mudaram de lugar.
Afastando as vaidades dos políticos de lado, o céu de hoje é de tempestade. A aposta flagrante de Ciro Gomes é que ele será um dos únicos com o pescoço fora da água quando a inundação baixar. Guardadas as proporções, Bolsonaro fez algo parecido na pandemia e hoje fica bravo quando é chamado de genocida. Vaidades pesam o suficiente para afogar gente grande na poça rasa.